domingo, 21 de novembro de 2010

Granada

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'Granada' é palavra espanhola para a nossa 'romã', cujo nome científico (latim) é Punica Granatum.



A romã-granada, fechada

 
Embora também nomeie uma poderosa arma de guerra (esqueçamos isso), 'granada' é para mim uma palavra carregada das mais agradáveis evocações. Além da evocação das habituais obras-de-arte, há outras cores e texturas, aromas, sons, paisagens...

O nome punica vem dos fenícios, que viveram na área do atual Líbano e cultivaram esta planta, difundindo-a pelo Mediterrâneo na antiguidade. Já o adjetivo granatum refere-se aos muitos 'grãos' que o fruto dessa planta apresenta. É dessa denominação latina da espécie que veio a palavra 'granada', presente ainda hoje no nome da fruta em várias línguas além do espanhol: grenadier (francês), pomegranate (inglês); melagrana melograno (italiano); Granatapfel (alemão). Na composição dos três últimos vocábulos existe em comum, além disso, a presença de outra fruta, a maçã, donde a romã seria então nessas línguas uma espécie de maçã de muitas sementes.



granatum: de muitos grãos | sementes


Na língua portuguesa, a fruta 'romã' foi nomeada por outro caminho; um caminho de origem egípcia e semítica na raiz mnr. Desta forma, por exemplo, 'romã' é algo como rimmôn em hebraico e rummân em árabe.

Essa fruta globular e perfumada, de casca cor de coral ou salmão e polpa de um vermelho profundo, desde a antiguidade adquiriu significados simbólicos os mais variados. Primeiramente, vem ligada à deusa fenícia Astarte e, mais tarde, ao mito grego de Perséfone (Prosérpina),  a filha de Deméter (Ceres) raptada por Hades e levada para o mundo inferior. Ao comer alguns grãos de uma romã no Hades, a filha de Ceres se condenou  a viver ali eternamente. Num acordo feito por intercessão de Zeus, Hades concedeu que  Perséfone vivesse a metade de cada ano na terra, ao lado da mãe, ocasião em que a natureza germinava e florescia. A passagem da deusa pela terra trazia então a primavera, ao passo que os seis meses de confinamento no Hades correspondiam aos tempos da terra infértil. Por essa razão, a romã desde bem cedo esteve ligada aos aspectos de fecundidade e fertilidade.



Dante Gabriel Rossetti. Perséfone. 1877.
óleo sobre tela; 46 x22". Londres, coleção privada



Na Roma antiga, a romã segura por Juno era símbolo do casamento, e a árvore de flores vermelhas e perfumadas vinculava-se à própria ideia do amor e do matrimônio que gerava filhos. Por isso as noivas levavam grinaldas trançadas com essas flores.


a flor estrelada da romãzeira

O cristianismo veio ampliar o leque de significados simbólicos dessa fruta, que frequentemente apareceu na companhia de Maria e do Menino Jesus:  se aparece nas mãos do Menino, que parece brincar com a fruta, simboliza sua ressurreição; se é fruto de uma árvore sob a qual a Virgem se abriga, conota sua castidade.




Botticelli. Madonna della melagrana. c.1487.
Têmpera sobre madeira; d 143cm. Florença, Galleria degli Uffizi





Às vezes a própria Virgem pode vir segurando a romã:



Veit Stoss. Madonna e Menino com Romã. 1500-1505.
Gravura metal; 21,7x16,3cm. Munique, Staatliche Graphische Sammlung



A mesma fruta nomeou - tradicionalmente se diz - a cidade andaluz de Granada, na Espanha, e discretamente participa do escudo, do brasão e da bandeira daquela localidade.






Da bela Granada, cidade espanhola que foi o último bastião dos mouros no país, indubitavel e inevitavelmente nos chegam outras mil evocações de sabor extravagante.


Vista de Granada com o Alhambra em primeiro plano e a Sierra Nevada ao fundo.


Memória de amplas tramas de arabescos e arcos pontiagudos, e de pátios de fontes frescas, e de luz vazada por abóbadas estreladas.


Interior do Alhambra, Granada, Espanha. Século XIV.


E, por, fim, memória de sons de guitarras flamengas e canções como a de Augustín Lara, Granada (1932):


Granada, interpretada por Djavan


Granada, tierra soñada por mí |
mi cantar se vuelve gitano cuando es para tí |
mi cantar hecho de fantasía |
mi cantar flor de melancolía |
que yo te vengo a dar. |
Granada, |
tierra ensangrentada |
en tardes de toros. |
Mujer que conserva el embrujo |
de los ojos moros; | 
te sueño rebelde y gitana | cubierta de flores |
y beso tu boca de grana |
jugosa manzana | que me habla de amores.



Granada, por Paco de Lucia






6 comentários:

  1. Letícia querida,

    gostei muito do seu texto e das imagens; a música então, me trouxe muito boas lembranças de uns quarenta anos atrás quando ouvi pela primeira vez esta canção.
    A romãzeira sempre exerceu sobre mim uma fascinante atração. É um arbusto lindo, folhas e flores delicadas de cores vibrantes. Os frutos com bagos que parecem pequenos e brilhantes rubis são sedutores, talvez para “combinar” com o simbolismo do fruto.
    Beijo

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  2. Amigo querido, sumido!!!! Gostei da sua imagem dos rubis: é isso mesmo, e lindo! Depois que escrevi aqui ontem, fiquei com tanta vontade de comer romã, mas é difícil encontrar.
    Beijos

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  3. Letícia, nem preciso dizer o quanto é bom ler seus post! adoro!!!!
    Adorei conhecer um pouco mais da simbologia da romã!!!
    Beijosss

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  4. 'Mirabilia Laetitiae'!
    'Quien no ha visto Granada, no visto nada'!
    '?El blog? !Guapísimo!
    !Ahora las clases son acá!
    Besitos...

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  5. Cris! Fico muito feliz que tenha descoberto o blog. Seja muito bem-vinda! Vou adorar ler seus comentários por aqui.
    beijos

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