domingo, 27 de maio de 2012

surpresa

para  a minha amiga Elaine,  
que sabe que é preciso nunca desistir 
de  regar as plantinhas
.



Quem tem gatos em casa sabe o quanto é difícil (ou impossível) manter as plantas inteiras (além dos sofás, das cortinas, tapetes, colchas...). Já tentei inúmeras vezes: compro vasos, planto, rego, cuido e num belíssimo dia encontro as coitadas comidas, viradas, pisadas... É desanimador; tanto, que desisti. Fiquei com uma série de vasos cheios de terra, uma cheflera capenga e meia dúzia de violetas sem flor e igualmente capengas que volta e meia resgato do chão.


As violetas são das minhas plantinhas prediletas, eu acho que por causa da sua simplicidade, pela beleza despretensiosa e variada, pela persistência, nem sei... Sei que me comove encontrá-las no supermercado, tão baratinhas, ou ganhá-las de brinde em qualquer evento. Uma vez ganhei uma, pelo dia das mães, na saída do bandejão da Unicamp. O fato é que as minhas há anos e anos não dão flores, quando muito põem botões que não vingam; vegetam, e eu nem olho mais para elas. É a Amélia quem cuida pacientemente e toda sexta-feira as rega, tira as folhinhas mortas, arruma a terra... Eu olho e penso comigo: inútil.

Mentira. 

Esta semana estava eu estendendo roupa na área de serviço quando dei de cara com a  incrível obstinação da natureza. Encontrei isso que se vê na fotografia acima: do cantinho ao qual eu a tinha relegado, a minha violeta mais prejudicada - linda, toda pintada, chamuscada de manchinhas roxas - abriu de repente não um botãozinho frouxo, mas uma porção de flores. Parecia me olhar e dizer "tá vendo só do que eu sou capaz, apesar de você?". Lembrei das muitas outras que joguei fora... Sim, tem que regar. Foi meu presente de aniversário, simbólico, humilde e evidentemente muito belo.




terça-feira, 15 de maio de 2012

Nudez

.
.
Amedeo Modigliani. Nu reclinado - grande nu. c.1919. óleo sobre tela; 72,4 x 116,5 cm. Nova Iorque, MoMA



Quando estás vestida,
ninguém imagina 
os mundos que escondes
sob as tuas roupas.

(Assim, quando é dia,
não temos noção
dos astros que luzem
no profundo céu.

Mas a noite é nua
e, nua na noite,
palpitam teus mundos
e os mundos da noite.

Brilham teus joelhos.
Brilha o teu umbigo.
Brilha toda a tua
lira abdominal.

Teus seios exíguos
- como na rijeza 
do tronco robusto
dois frutos pequenos -

Brilham.) Ah teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!

Se nua, teus olhos
ficam nus também;
Teu olhar mais longo, 
mais lento, mais líquido.

Então, dentro deles,
bóio, nado, salto,
baixo num mergulho
perpendicular!

Baixo até o mais fundo
do teu ser, lá onde
Me sorri tua alma
nua, nua, nua.


(Nu, Manuel Bandeira)