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.Para a Pepa-Pepinha-Pepita-Peputcha,
que de palavras não sabe nem sonha, mas hoje nos deixa tendo sabido (e vivido) um pouquinho do amor
Pepinha assim que chegou em casa, bebê, há sete anos
Numa vida inteira quantos nomes será que o amor pode ter?
Nomes sérios, que se acompanham de sobrenomes ainda mais sisudos, ou apelidos carinhosos, curtinhos e saborosos, que se multiplicam sem cessar conforme os trejeitos do muito afeto.
Nome de mãe, nome de pai, os primeiros que a gente aprende e nunca esquece: nome de pedir socorro, abraço e colo.
Nome de filho, que é escolha séria e calibrada, plantada junto com a semente que enraiza e jamais jamais se vai...
Nome de irmão, de mano, de quem compartilha.
Nome de amigo, que é letra e melodia quando se escuta do outro lado da linha ou quando se enxerga, em destaque imediato, entre as linhas monótonas do correio virtual.
Nome de namorado, que a gente guardava com o baú das cartas, quando o correio era mais lento e as esperas imensas, e depois sonhava, e repetia em voz alta nas falas solitárias, e anotava nos diários...
E um nome de rua, um nome de cidade, quem nunca amou?
Nome de bicho...
Nome de bicho: desses possíveis (tantos!) nomes do amor isso sim tem muita gente que não sabe.... E eu sinto pena de quem nunca provou deste, uma pena que é bastante próxima da que experimento em relação àqueles que, por diversas razões, são incapazes até mesmo de enxergar-ver-avistar o ipê branco que se abre todos os anos na praça e a abraça inteiro com sua copa generosa e deslumbrante, protagonista absoluto da cena. Pisam suas flores, mas não olham para cima. Não se dão conta.
Então é hora de confessar aqui meu preconceito terrível contra dois tipos de gente (que, na verdade, costumam se reunir num só): gente que não gosta de criança e gente que não gosta de animais. Nem passo perto!
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Um dia, há sete anos, passando de carro em frente à veterinária já avistei a gaiolinha das doações com uma caixinha dentro. Tinha gente pequena ali. Fui ver. Um filhote lindo de morrer, bege tigrado de olhos imensos de um azul asa de borboleta rara. Veio serelepe, já sabendo, a danada, de como era sedutora. Enquanto eu corria pra ela, uma moça tomou a minha frente e a apanhou no colo, a gata linda. "Eu vi primeiro", me disse de uma forma irritante. "Tá bom", pensei comigo, e já me virava pra ir embora quando avistei no fundo da caixinha de papelão dois outros olhões brilhantes, menos belos, certamente, e tímidos, e tristes, exatamente como mostra a fotografia que escolhi. Irmã da radiante, muito menos radiante, estava ali a Pepita, que apanhei imediatamente e levei pra casa.
Eu já tinha a Nina, um ano mais velha, e queria uma companheira para ela. Também a Nina viera da mesma gaiola dos bichinhos abandonados. Uma semana mais tarde, a moça afobada que havia levado a irmã loura da Pepinha a devolveu, alegando que fazia estragos demais, bagunça demais. E foi assim que a Lola veio também morar conosco. Arrumamos, de repente, um delicioso balaio de gatas!
Lola, Pepa e Nina, meu balaio de gatas
Nina é a dona do pedaço, a primeira a comer, a que decide; Lola é a bela (exibiiiiiiida!); Pepinha, a resignada, humilde, isolada, retraída, talvez triste. Não disputava as fatias de presunto, levava uns chega-pra-lá da Nina, era a primeira a se retirar nas situações alegres. Era, enfim, a mais frágil, aquela mesma que ninguém via no fundo da caixinha surrada em que a conheci. Mas eu a vi. E ela sabe disso.
Neste momento, enquanto escrevo este texto, Pepinha está aqui ao lado, embrulhadinha no cobertor, imóvel. Agoniza após uma semana de internação e sofrimentos inúteis. Somente os olhos tristonhos de sempre me acompanham, me fixam, não me deixam... Mais oblíquos do que nunca, secos e fundos. Se eu desapareço por um instante de seu campo de visão, ela me recebe com miado fraco assim que retorno. Será que me chama? Seus olhinhos baços me dizem que, embora sua vida tenha sido breve e bem pouco emocionante, ela sabe sim que faz parte da minha história e da da minha filha e, sobretudo, que o seu nome é um daqueles a que eu chamo amor.
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