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("A variedade deleita...")
Esta sou eu aos dezoito anos desenhando pedrinhas numa aula de plástica.
O exercício consistia em sair pelo campus selecionando e recolhendo objetos ou elementos naturais e depois reorganizá-los para criar uma composição em desenho. Foi ali, naquelas aulas de observação do mundo que eu descobri outras dimensões da mesma realidade, aprendi a procurar a beleza em lugares insuspeitados, aprendi a ver. Assim, no interminável caminho de ônibus até a universidade, eu me ocupava procurando beleza nos ângulos retos de uma construção qualquer - vazios e plenos em sua insípida variedade de cinzas, jogos de luz e sombra, ritmos... Às vezes, chegava em casa com a mochila carregada de pedras variadas, as páginas dos cadernos guardando uma ou outra folha de árvore de forma mais arrojada ou cores exuberantes, múltiplas. Na falta de lápis ou caderno à mão ou de uma máquina fotográfica, nunca deixei de colecionar meus instantâneos imaginários, e até hoje cato em absoluto deleite conchinhas, sementes e pedras coloridas nas praias.
As habilidades práticas que adquiri um dia, creio já tê-las perdido há muito, mas não essa capacidade - nem a vontade e o prazer - de descobrir a beleza menos evidente nas coisas mais óbvias e corriqueiras, de descobri-la eventualmente até mesmo na feiura, ainda que tudo isso tenha me tornado mais suscetível às agressões do sórdido e do grosseiro. Há que se descobrir o quanto a vida é bela.
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